terça-feira, 28 de abril de 2009

O gasolina

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A MINHA INFÂNCIA em Cascais foi muito animada pelos desportos náuticos, ou não tivesse eu aprendido a nadar ao largo da praia da Conceição, agarrado a bolas de cautchu, aprimorando depois os estilos no Algés e Dafundo, sob o olhar severo de Bessone Bastos.
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Apesar de sonhar com aqueles grandes e lindos gasolinas de madeira envernizada, tubos de escape cromados e um ronronar sensual de galões de gasolina, apinhados de lindas meninas de “maillot”, “echarpes”de seda e óculos escuros a rodearem um cavalheiro muito bronzeado ao volante, a minha História Trágico Marítima escreveu-se à base de chatas a remos, de aluguer, ou pedalando furiosamente em gaivotas, nas quais fingia não ver os gestos vigorosos de impiedosos banheiros que exigiam o retorno imediato e ameaçavam nunca mais me alugarem uma geringonça daquelas.
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O gasolina americano, só visível nos filmes de Miami e de Malibu, era invejável no mar de Cascais e acostava graciosamente ao pontão do clube naval, servindo também de transporte para os mirones das regatas, quando as havia. Mas puxaram muito boa gente até esta se erguer e aguentar nos esquis, aos quais a velocidade dava rumo e equilíbrio. Tão boa gente, que nem eu próprio escapei...
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O gasolina tinha uns parentes pobres na Feira Popular, em Palhavã. Mais pequenos, muito lentos e ruidosos, fedorentos, mas também de madeira envernizada, fumegavam tanto que um aluguer de 15 minutos devia fazer pior aos pulmões do que três maços de Kentucky, ou de qualquer outra marca de mata ratos sem filtro.
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Era naquele quarto de hora de aluguer que eu ouvia os violinos e via o ballet aquático que acompanhava a desejável Esther Williams com quem sonhava nadar um dia, armado em Gene Kelly dos lagos e piscinas. Sonhos molhados de adolescente que Cascais inspirava…
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