sábado, 20 de novembro de 2010

Três badaladas e um balde de cal

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FOI NO MÊS de Novembro que a “Mais Alentejo” juntou mais de duas centenas dos seus leitores, colaboradores, autores e anunciantes num Hotel Design de Tróia e, caldeando-os com autarcas do Alentejo, deputados da Nação, mulheres bonitas e figuras das artes, do desporto e do espectáculo, procedeu à entrega dos prémios atribuídos pelo seu público, num ambiente de festa, de requinte, boa mesa e alegre e discreta elegância.

Não faltava lá ninguém, o espectáculo parecia uma entrega de Óscares, não houve quem não estivesse agradado e a alegria durou até ás tantas.

Foi neste ambiente e nesta festa que houve quem resolvesse atribuir-me e entregar-me o Prémio Carreira - Jornalismo da “Mais Alentejo”. Posso ter muitas suspeitas, mas estou em crer que foi o António Sancho, a alma desta revista, o “culpado” disto ter acontecido. O que é uma injustiça, por haver outros mais merecedores. Mesmo que não pense assim, têm de concordar que me fica bem dizer tal coisa.

A verdade é que com o andar dos anos, uma pessoa vai acumulando distinções e assim, inesperadas, como foi esta, a sensação que se tem é a de os amigos estarem a despedir-se por termos alguma doença má que ignoramos e de que ninguém nos fala. Deus me perdoe, mas estes prémios de carreira, com que se celebra e se arruma uma vida de trabalho, assemelham-se a elogiosos obituários publicados pela secção de necrologia de uma publicação.

Se a minha saudosa avó Felicidade fosse viva, de certeza que não perdoaria. Punha o seu sorriso sardónico e dizia-me, com o carinho com que sempre me tratou:
-Oh filho! Depois disto, só três badaladas e um balde de cal…

P.S.- Deixem-me que deseje a todos os que aqui trabalham e aos que lêem esta revista um Natal muito feliz e uma passagem de ano cheia de alegria e felicidade.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Cães, gatos e olhares para o lenço

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UM QUERIDO amigo meu, que há muito não tinha o prazer de rever, desafiou-me a escrever histórias do passado, ocorridas comigo e com personalidades nacionais e estrangeiras dignas de destaque, bem como me exortou ainda a narrar factos importantes por mim vividos.

Confessei-lhe que já há muito me ocorrera semelhante pensamento, mas logo o abandonei por diversas razões. A primeira, é uma rejeição muito pessoal desse tipo de escrita, talvez inspirada, desde muito jovem ainda, por uma frase de Pittigrilli que nunca esqueci: aquele que escreve memórias é como um fulano que se assoa e depois olha para o lenço, antes de dobrar e guardar no bolso.

Depois desta razão principal argumentei com o meu amigo explicando-lhe ainda que ele não imaginava a quantidade de histórias adulteradas e narradas por falsas testemunhas ou participantes mentirosos, com má memória e sem vergonha nenhuma, capaz de jurarem a pé juntos terem travado um diálogo ou assistido a um facto que nunca aconteceram.

As inexactidões deste tipo são muitas vezes ditadas pela vaidade, pela inveja, pela desonestidade e pela pouca vergonha, ou ainda, ingenuamente, pelo desejo de ter graça. E uma coisa é contar histórias que podem ser corroboradas por alguém mais, que verdadeiramente as viveu, outra é fingir que se recorda acontecimentos e frases que nunca existiram com alguém, e de gente, que já não está entre os vivos e não se pode defender da calúnia e limpar-se de algo que nunca fez ou de alguma coisa que não proferiu.

Numa terra sem memória e cada vez mais à mercê de gente pouco séria que à memória exacta da verdade prefere a vaga ideia da mentira, é melhor não nos metermos nisso de recordações, a não ser aqueles destinadas aos filhos e netos estremecidos e amigos de confiança. De outra maneira, corremos igualmente o risco de parecermos um desses aldrabões de feira que nos contam o que mais lhes convém ou aquilo que os torna engraçados, e perder-nos nessa interminável multidão de cães e gatos que são autores. Ou, hoje em dia, conhecem algum cão ou gato que não tenha escrito um livrinho?
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«Mais Alentejo» - Nov 2010